domingo, 1 de abril de 2012

Ro Ro, uma senhora sem fio e sem navalha


Toda de preto e com um tênis que a aproximava mais de uma esteira do que do palco, Angela Ro Ro se apresentou no anfiteatro do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura neste sábado (31). No alto dos seus 62 anos, a artista carioca mais uma vez foi a grande estrela da noite. Normal para quem possui uma voz ao mesmo tempo sexy e descontraída.

                O que mais chama atenção na performance de um dos mais misteriosos nomes da Música Popular Brasileira é a mudança de espírito e corpo que Ro Ro viveu na última década. Deixou pra lá a barreira dos mais de 100 quilos e incorporou uma nova mulher, tão sarcástica quanto ontem, com umas doses a menos.

                 O show, que fazia parte da Série Depoimentos, traz como princípio a alternância entre canções e perguntas feitas pela plateia (o que é totalmente desnecessário porque as perguntas são muito burras) e por um “bobo da corte” chamado jornalista Cristiano Pinho, e tem patrocínio da Coca-Cola. E como disse Ângela: “Já usei muita coca e muita cola. Mais que o Pablo Escobar e o Hugo Chávez. Qual dos dois ainda está vivo?”.

                Ro Ro agarra com maestria seu passado polêmico e sua experiência de longos anos no meio artístico para abrir a boca, ela nunca foi de se calar. Escancarou o coração e assumiu que não voltaria mais a Fortaleza, depois que um jornal local (provavelmente O Povo) teria estampado em sua capa de cultura que a cantora seria “aliciadora de menores” e “traficante de drogas” há três anos. Amaldiçoou a capital cearense, e no início da apresentação lambeu o veneno e ironizou os detentores do “poder intelectual”. “Me arrependo (sic) de nunca ter processado ninguém, mas vou tratar de resolver este problema ainda em 2012”, rechaçou.

                Não esqueceu de comentar a falta de dinheiro, que muitos consagrados artistas de outras décadas sentem após o ostracismo causado pelas ditas "novidades". Ângela brincou com tudo dizendo, "antes andava sobre o fio da navalha, mas hoje cadê a navalha? Nem a navalha restou".

                Dentre clássicos como “Amor, meu Grande Amor” e versão de “Ne me quitte pas”, a intérprete, compositora e pianista deixou de lado a modéstia e atacou muitos. A internet e até as cópias. “Tivemos agora há pouco uma cover da Cássia Eller (se referindo a uma cantora cearense que abriu seu show)” e desqualificando a jovem.

                No fundo, o que Ângela quis nos dizer, e só muito poucos entenderam, é que ser artistas é debochar daquilo que se faz. Se Ro Ro realmente vivesse o que canta, já estaria nas páginas do obituário assim como fizeram Maysa e Amy Winehouse. É preciso rir da arte que se faz, visto que é humanamente impossível levar o personagem dos palcos para o convívio do lar.

'Destaque ao descobrir que o apelido Ro Ro de Ângela tem a ver com sua risada rouca e também que a música 'Malandragem' foi composta pra ela. Tudo faz sentido agora'.