quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Merecemos este metrô?!


Pouco depois que nasci foi assinado o contrato que daria início ao processo de construção do metrô de Fortaleza. Na época, o papel assinado pelo Governo do Estado, a extinta Rede Ferroviária Federal, Sociedade Anônima (RFFSA) e a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) despertou em muitos alencarinos o sonho de um novo meio de transporte para desafogar a chegada ao trabalho, ao comércio, aos estudos e, quem sabe, ao lazer.

Enquanto se pensava que os trens seriam suficientes para levar a Fortaleza aos quatro cantos não se imaginava que quase 25 anos depois ainda estaríamos em ônibus lotados. Pois é, o Metrofor é meu contemporâneo e, como eu (e você), enfrentou muitas crises até tomar forma.



Nestes anos que se arrastaram lentamente a falta de pulso firme do poder público fez com que as obras emperrassem e o futuro de um transporte limpo e barato fosse adiado, até chegar ao campo da imaginação. 
Virou piada andar de metrô na Capital, o que pode ser considerado um dos grandes atrasos de uma sociedade que quer estar à frente das outras, principalmente das do interior do Estado.

A construção do metrô teve seu investimento inicial triplicado com o passar dos anos. Em quatro deles nenhum operário movimentou uma pedra. O Tribunal de Contas da União, em 2009, pediu que a empresa responsável pelas obras parasse para que um superfaturamento de R$ 65 milhões fosse investigado. Nada aconteceu.

Daí apareceram impasses sobre a demolição de prédios históricos, retirada de comerciantes do popular Beco da Poeira, dentre outros probleminhas de percurso. Com os olhinhos brilhando víamos os vagões chegando da distante Europa. Aos poucos, os trilhos começaram a ganhar as páginas das propagandas governamentais, o que para alguns é sinônimo de progresso.

Mas, faltando pouco tempo para a efetivação da Linha Sul ainda não foi debatido o que de fato é importante. Se a espera pelo transporte coletivo já foi tão grande, é preciso pensar o que fazer com ele a partir de agora.

Deixando de lado os fatores políticos, outro impasse que compromete a boa utilização do metrô de Fortaleza cabe a cada um de nós. Nossa cultura está preparada para tal inovação? Saberemos respeitar as regras e nos deixar impor às condições necessárias para transformar o transporte em um espaço civilizado?

A proposta revolucionária faz sucesso em grandes cidades. Quem nunca ouviu falar no sonho que é o metrô de Paris, que além de um espaço público é patrimônio cultural. Os “subways” londrinos e os túneis de Nova Iorque, sempre retratados em filmes e publicidade. A única chance que tive de andar neste tipo de meio de transporte foi em Recife, e causa apreensão pensar que a proposta não seja bem entendida.

Enquanto princípios como a responsabilidade com o bem público e a importância de sua conservação realmente não chegar à mídia e, consequentemente, às rodas de conversas a sociedade estará à mercê de um grande e doloroso insucesso. Os ônibus, definitivamente, nunca deram certo pra valer.

Muita discussão virá à tona nos próximos meses. Principalmente às vésperas de junho deste ano, prazo dado pelo Governo para inaugurar a obra. Mas, já se pode começar a exercitar a “mufa” e debater de que maneira a obra que completou 13 anos de vida não morra tão cedo. 

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Helenice Caminha


Helenice caminha todas as manhãs. Quatro quarteirões até a parada de ônibus em um ponto movimentado da cidade. O trajeto, cheio de curvas e obstáculos, se torna a cada dia algo mais crucial para a jovem recém-saída da faculdade.

A moça é loira e tem cabelos longos. Alisados e pintados, como é peculiar na sua geração. Mas o que chama atenção em seu rosto é a sutileza do sorriso, amalgamado com um vibrante aparelho em tons de cinza e rosa pink.

Ela entra cedo no trabalho. Batalhou por muito tempo uma vaga neste posto. As más línguas dizem que Helenice precisou utilizar de suas curvas e ofereceu horas-extras na cama de um dos chefes. Tudo maldade. As colegas de hoje em dia é que não sabem respeitar a reclusão e a seriedade de uma menina predestinada ao trabalho.

Ela ainda não sabe, mas odeia o que faz. Acha digno ocupar um posto em uma das mais limpas clínicas de veterinária da Capital. Diz que “nasceu para servir” e nem percebe que seu “slogan” apetece o gosto dos clientes, que abusam do seu carisma. Helenice sorri, mas não se assombra. No fundo de sua alma está o sonho de ter seu próprio negócio. Cuidar da sua própria matilha.

A jovem sai feliz, saltitante em passarela em plena 5h30 da manhã. De sua casa até o trabalho são no mínimo 45 minutos de corpos suados, rostos tristes e cansados. Ela não os percebe muito bem porque se distrais com o celular que transmite a programação do rádio. Gosta de ouvir as notícias. Para alguém de sua origem, poder falar de vários assuntos é sinal de inteligência, de reclusão. É ser uma grande exceção em um mundo repleto de coincidências. Mas ela não é diferente, pelo contrário. Helenice não sabe, mas está em todos os lugares.

Nos 15 minutos que separam Helenice de seu destino ela gosta de pensar na vida. Mesmo sem querer. O que o dia lhe trará? Por que o mendigo dorme na rua? Por que não tem tempo de ir ao banco resolver aquela pendência chata? Percebe o quanto está cansada. É o destino. E assim passam questões de todas as grandezas que, caso analisadas com maior precisão, poderiam oferecer a menina um mapa da sua própria existência. Aquele buraco-negro que todos têm durante a vida e não sabem o que fazer. Jogar-se na escuridão ou se jogar na escuridão? “Navegar é preciso, viver não é preciso”. Como um flash, tudo se esvai e uma nova futilidade vem à cabeça.

Os quadris balançam. Uma gota de sensualidade que persiste no corpo de Helenice. Sua mãe a ensinou os “pudores” que fazem uma mulher ser respeitada em um mundo onde o sexo pode transformar tudo. Ela sabe que as calças jeans, por mais sufocantes que sejam, fazem parte do protocolo. “Preferiria um vestido”, martelava em seu subconsciente.

No caminho, se deparava com alguns rostos conhecidos. As velhinhas de sempre que levavam o cachorro para passear, o entregador de jornal, o vigia da loja e o pedinte da esquina. Todos tão íntimos, compartilhando o único instinto de proximidade que resiste na liquidez mundana: a vontade. Helenice pensa que todos aqueles personagens não sabem nada uns dos outros, mas sobrevivem com a esperança de que os laços imaginários ainda são capazes da transformação. Que bobagem!

Helenice caminha, está a dois quarteirões do ponto do transporte. A mente voa com o vento e as primeiras nuvens da estação de fevereiro. O mundo paira em sua cabeça e ela vai despercebida. “Sou feliz?”. Anda, anda, anda até a esquina. Despercebida parte em direção ao outro lado sem reparar o vermelho no sinal. Um barulho agudo. Um cheiro de morte sobe.

A jovem está parada, olhos arregalados. “Está louca, minha filha?!”. Foi por um triz. Mesmo assustada, abaixa a cabeça e prossegue ao seu destino. Sente vergonha do erro, mas caminha. Alguém balbucia algo que não é importante e a moça se benze. Lá vem seu ônibus. “Será que sou feliz?”.

Helenice subiu no coletivo por mais dois dias, e nunca mais foi vista na caminhada matinal.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O domingo e suas angústias

Viva a ansiedade e a espera por um bom dia de domingo. A folga almejada por 10 entre 10 cidadãos do mundo que não esqueceram que a existência não se resume ao trabalho. Como é bom pensar em um dia onde somos donos de nós mesmos e do nosso descanso.

Desde pequeno, na minha  cidade, descobri que o domingo é dia de se resguardar. Segunda-feira aparece sorrateira e perigosa, precisamos estar bem preparados para deflorá-la. As manhãs, com trilha sonora do Padre Zezinho, eram um prenúncio de um dia tranquilo. Que nem sempre era. Os percalços do álcool alheio ou uma briga entre vizinhos gostava de manchetar o dia de entrega à existência.

Seja de rede, cama, sofá, ou cadeira de balanço ele era vivido com intensidade. Não sei, sinceramente, o que faz uma pessoa idolatrar a labuta e sentir falta do estresse diário. Para mim, mais fundamental que o trabalho é a folga, o ócio produtivo, que me permite acordar da Matrix e enxergar o que está por detrás das entrelinhas. Caso meus chefes percebessem isso me dariam folgas e folgas, visto que tal combustível elevaria exponencialmente minha criatividade.

Mas, nem sempre de glórias os domingos são formados. A presença da mídia e a vontade de se fazer tudo em pouco tempo tem deixado a humanidade ansiosa. Essa autodestruição faz com que cheguemos a conclusão de que todo o tempo é pouco. E que precisamos ganhar mais dinheiro. E que precisamos fazer mais horas extras para que as datas comemorativas cheguem logo e passem logo.

Há muito não percebo nos olhares as expectativas das grandes comemorações. É carnaval e as praças não têm decoração. As crianças não compraram fantasias. Ninguém tocou marchinha. E o comércio não pára. Assustou-me um anúncio da festa de ressaca do Carnaval. Estamos matando a vida de véspera. Estamos ejaculando precocemente as possibilidades.

Um teórico, a quem me afeiçoei nos últimos tempos, anda dizendo que não possuímos condições suficientes de manter laços ou amar alguém. "Ame ao próximo como a si mesmo". A frase perde o sentido quando nem sabemos o que é amor e, segundo, quando não calculamos o real amor que temos por nós mesmos.

Enquanto o domingo está aí de braços abertos para nós. Passeios públicos, praias, bicicletas, comidas deliciosas, sorrisos de mãe. Estamos aqui, lendo este texto. Sei o quanto a audiência é importante para um trabalho como o meu, mas estou certo de que se meus leitores deixassem meu blog por uns instantes para viver a vida e olhar nos olhos de quem amam, eles voltariam mais e mais vezes, compartilhariam comigo todos os seus anseios e estariam debatendo arduamente o que nos falta para a suprema felicidade.

Lembro agora de uma menina que quer tudo e nada ao mesmo tempo. Ela já pensou em tudo o que seria possível para tirá-la da angústia da ansiedade e ser dona de sua própria vida. Mas compartilha com meios que não lhe trazem as respostas suficientes. Pobre.

Enfim, mais um domingo se passou e mais um domingo chegará. A semelhança é que cada semana que passar vamos ouvir de todos que este dia já não é mais suficiente. A existência já não é mais suficiente. O que nos resta é a ansiedade de viver o que está por vir a cada novo minuto.
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Um dia de domingo. Quando o dia amanhece esticado, sem pressa e com vontade de chegar à conclusão de que nada existe além da sua cama. Cafuné de lado, sorrisos sonolentos de outro. Vamos esperar a natureza. Pé com pé. Perna na perna. Zumbidos e agrurinhas. Tão fofinhas e irresistíveis.


Sinto o sabor da manhã, os raios de sol, como naquela música onde os pingos da chuva bailam como Fred Astaire. Vem o 'white coffee' com uma amanteigada torrada e os assuntos que não querem calar. A cantora que morreu, o jogo que está por vir, as histórias contadas durante toda a semana, as farras que fazem a diferença, os projetos para o futuro e a esperança de muitos e muitos domingos.


Um cochilo daqui, ou uns posts no Facebook?! É bom olhar os amigos por trás da tela de vidro quando você quer estar sozinho. Fazendo seu dia. Olhando para os livros, lendo um pouco e interpretando muito. Nada de muitas roupas, um shortinho de jogador, sem camisa mesmo. O que não pode faltar é o cabelo assanhado, que se penteia à espera do almoço.


Banquete regado a uma cervejinha e pelo ar delirante de quem se ama. Tem de tudo um pouco. Drama, emoção, carinho, temor. Tem de tudo que a vida faz novela e que dá gosto de cantar. É um caminho perverso e gostoso até o final da tarde. Chega a concentração. Um pouco de TV ou DVD. E lá se vai o domingo melancólico. O dia de descanso que ninguém descansa. O que há de errado?! Eis o mistério da fé. Eis a verdade da existência.


Tudo é lindo e ousado. Mas poderia ganhar cores ainda mais vibrantes se não permanecessem somente no áureo e fumacento mundo das especulações. Que ingrato então?! 

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Quem vai seguir a dieta da morte?!

A revista "Superinteressante", a mais consagrada pelo público entre os periódicos sobre ciências no Brasil, destacou os oito alimentos venenosos "que a gente ama comer". Completamente assustado fui correndo ver o que era, porque para "ex-gordinho" saborear nunca vai deixar de ser um prazer indispensável.

Na lista frutas e legumes, que geralmente não estão na dieta dos brasileiros, que trocam facilmente um copo de suco de cajá (meu predileto!) por um refrigerante borbulhante. Maçã, batata inglesa, cereja, puxa como tudo isso pode ser tão letal. Como serão os aniversários sem aquele toque vermelho sobre o calórico e adocicado bolo?

A matéria também destacou outras comidas que podem nos deixar "doidões" como os cogumelos e as amêndoas, mas não foi exatamente a lista que me inspirou a vir compartilhar este momento insólito. A reportagem deixou clara a máxima: tudo em excesso é perigoso! Por isso, para chegar ao (tão sonhado para alguns) óbito é preciso ir além do que o previsto. Transpor o absurdo e se entupir de caroço de maçã.

Na sociedade em que Adele é ícone não podemos simplesmente brincar. Ser deprimido, descuidado, e culpar tudo que está ao seu redor é tarefa simples para qualquer existência. Os excessos são comuns e plausíveis. É mesmo difícil viver neste mundo em que nada pertence a ninguém e que o poder de escolha sobre o que queremos da vida já nos foi retirado há séculos.

É doloroso, mas compreendo o quanto é irresistível passar horas em um drive thru de uma famosa marca de sanduíches, compras quibes, quiches e michês do que desperdiçar o mesmo tempo contemplando o mar; substituir a boa e velha "swingueira" e as trabalhadas letras de forró por um espetáculo teatral que ninguém entende nada mesmo, mas diz que foi a melhor peça que já viu; ou então, o cheiro das roupas e perfumes de marcas ao toque instantâneo de uma rosa recém-colhida.

Viver bem dá trabalho. E este não é um mundo feito para quem quer trabalho de verdade. O tempo é curto. A vida passa. E nós, onde ficamos?! Na maioria das vezes debruçados sobre amêndoas, maçãs e batatas fritas esperando que de repente a morte nos abrace.